O multinstrumentista Dillo Daraujo nasceu em Brasília e, em 2004 lançou seu primeiro CD “CrocoDilloGang”, obtendo grande repercussão na imprensa especializada, CD este que o levou a tocar em festivais de porte nacional como Festival de Inverno de Bonito MS, Festival de Primavera da PUC Rio, Porão do Rock DF, Festival Multicultural, Bourbon Street em São Paulo, dividindo o palco com artistas do quilate de Moraes Moreira, Nando Reis, Barão Vermelho, Los Hermanos entre outros. No ano de 2005, Dillo se mudou para o Rio de Janeiro para fazer música para cinema, entre seus trabalhos mais destacados estão o High School Musical(Disney/Total filmes) e Para Pedir Perdão de Iberê Carvalho, filme vencedor do festival de Havana 2009.
Em 2008 lançou “Mestiço” seu segundo CD, e se prepara agora para lançar seu filme, o documentário musical autobiográfico “Musica Roqueira Popular Brasileira” numa extensa turnê marcada para iniciar em abril de 2010, caravana esta que passará por Rio, São Paulo, Belo Horizonte, Recife e Brasilia, fechando em outubro no MIDEM em Copenhagen. Antes do Show que Dillo fez no Velvet Pub em Brasília, ele paraou um pouquinho pra falar com a gente, confira a entrevista!
Coolt: O primeiro cd - CrocodilloGang, tem uma pegada Rock’nRoll. Acho que até o fato de ser em inglês colabora para isso. Aí de repente o cd Mestiço vem transbordando brasilidade. Eu já li você comentando que está de corpo e alma nos dois trabalhos. Mas e o seu público, como ele reagiu a essa transformação?
Dillo: Na verdade, o que a gente poderia chamar de público era muita gente interessada na guitarra elétrica, muito aluno de guitarra, fãs de Rock, infanto-juvenil entre 15 e 25 anos, geralmente, amantes de guitarra, de pedais, dessa estética da guitarra elétrica. Eu acho que no primeiro momento do segundo cd, o Mestiço, foi de choque. Pelo menos eu soube, ninguém me falou diretamente, mas eu ouvi assim “Ah o Dillo tá perdendo um pouco da raiva, da fúria”; teve esse primeiro estranhamento. Num segundo momento, eu acho que, essas mesmas pessoas que tiveram esse estranhamento, ao observarem mais o disco em português, começaram a se reaproximar, eu recebo, hoje, pelo Orkut, gente que tem banda, de guitarristas, “Pô, vou lá ver teu show”, “E aquela guitarra nova”, “Que pedal você está usando”. Então, eu posso dizer que eu perdi o meu primeiro público e reconquistei a metade dele público e com o segundo álbum eu fui agregando um novo público, e hoje acho que esses dois públicos já transitam no mesmo ambiente. Eu estive agora ali embaixo (se referindo ao ambiente do Show), encontrei uma galera, já tem gente dessas duas safras...
... Mas quem te reconhece como um artista rockroll, quem conhece e gosta de rockroll meio que se prepara pra um disco não ser igual ao outro né? O seu próximo disco nunca vai ser igual ao do momento...
Exatamente, e isso me instiga muito, a coisa da possibilidade de veir uma nova paisagem, uma nova provocação, justamente pra qualificar o debate e a gente poder chegar nesse consenso de estética, de tempo, de proposição artística, eu acho.
Coolt: Te incomoda o fato de o eixo de visibilidade no Brasil hoje ser Rio/São Paulo, você ter que sair da sua cidade pra conseguir ser visto mesmo?
Dillo: Ah sim, eu gostaria de morar em Brasília Fulltime, poder pegar minha filha e levar pra escola, pra ir com a minha mãe visitar uma tia. Meu sonho! Mas se ficar só em Brasília, em 4 meses você esgota a cena, o público cansa de você e você cansa do público. Eu acho que tem circular mesmo...
... Com certeza o artista tem que circular, mas tenho a impressão de que a casa do artista nunca pode ser fora desse eixo de visibilidade...
Mas eu creio que isso vai mudar, que isso está mudando, eu sou muito otimista! Acho que Brasília é uma cidade que está ganhando uma outra proporção em termos de contingente. Por exemplo, Brasília como eu conheci quando comecei a tocar na noite era diferente, a cidade era mais vazia; então as pessoas iam pro mesmo lugar, na época o teatro garagem, a galera meio que se conhecia, a cena de rock. E hoje eu já noto que existe uma guetificação. Existe um monte de bandas, uma explosão de bandas Covers né, muita gente comprou instrumento, aprendeu a tocar, sei lá, quadriplicou o contingente populacional e eu sinto que Brasília, tá virando uma cidade de outro porte, não é mais a Brasília como eu conheci e com isso em 4 anos o artista vai poder e ter uma circulação tipo: ele toca em Brazlândia, depois toca em Sobradinho, depois na Ceilândia, Plano Piloto e assim o artista circular. Ao invés de ser como era no passado que todo mundo ia pro mesmo lugar, o artista vai pra onde as pessoas estão, porque as pessoas não transitam mais inter-bairros, por causa de congestionamento e porque a gente sabe que a cidade não é integrada também do ponto de vista de transporte público. É só achismo, mas acredito que vai poder ter essa circulação. E isso também vem agregado a um monte de outras transformações, como o impacto da era digital, porque não só a cena mudou, a cidade mudou, como mudou também os meios dentro da cadeia produtiva da música, de distribuição, de produção, muita coisa mudou, é outra dinâmica. No meu DVD eu discuto a cena, do ponto de vista do instrumentista nos anos 90, que a internet modificou, até onde ela foi nociva, como beneficiou, uma pincelada meio por alto. A música ao vivo começa a sofrer essa transformação que outras profissões da idade média sofreram, de manufatura, que foram desaparecendo pelas inovações tecnológicas. A onda da música eletrônica com os Dj`s, o desinteresse pela música orgância, a velocidade da troca de informações, a falta de fixação das manifestações artistícas. Nos anos 90 a gente comprava um disco de vinil e ficava olhando a capa durante seis meses e ouvia os dois lados do disco, eu vivi isso, de você saber as falas que tinham entre as músicas. hoje ninguém vê capa de disco. As pessoas tragam as músicas pros mp3 players, desprezam as capas e se a música está chata eles já vão pra próxima. Antigamente você tinha que abrir o toca disco, pegar a agulha com muito cuidado e levar até a próxima faixa. Era um trabalhão...
...Hoje não se vê a unidade do cd né, que é uma obra que funciona junto. Agora você escuta só um pedaço e não sabe o que o artista quer dizer com tudo..
Exatamente, dilui a idéia de álbum. Que é o que os meus 2 primeiros discos tem. Quem ouve só uma pincelada acha muito discrepante, mas se você reparar existe uma linha que permeia os dois álbuns que é a guitarra elétrica da forma como eu imprimo o som. Se a gente for analisar do ponto de vista musical, eu uso muito as escalas pentatônicas que remetem ao Blues, ao Rock. Então essa sonoridade está nos dois discos.
Coolt: Em 2005 você começou a fazer música pra cinema. Como isso afeta o seu processo de criação? Ter que fazer música para o filme.
A primeira coisa é diluir o ego né. Porque a música tem que estar a favor não é nem da cena, mas da narrativa psicológica. Pode ter uma cena linda do pôr-do-sol, mas se o protagonista está vivendo uma situação de transtorno, a música tem que incomodar. Esse é o grande diferencial: é você começar a tocar para a narrativa psicológica, e não para o que se vê ou o que se espera, isso quando é música original para o filme. Uma outra coisa é trilha sonora: pegar músicas que já existem e colocar dentro do filme como o Tarantino faz muito bem. A trilha é composta de vários artistas. A música original para o filme é chamada diegética ou seja ela não pode estar em primeiro plano. A gente nem nota que está rolando, mas se tirar, você sente falta. Às vezes fica só no som do vento e um piano com duas notas bem agudas, é outra abordagem, é muito legal. Isso abriu muito a minha cabeça até para as composições de canções da minha obra como compositor. A gente amadurece. Porque no meu primeiro disco, eu fiquei meio assim quando vocês disseram que é muito diferente, tô sempre voltando a isso ... (risos)
...Mas alguém já te disse isso antes né?
Já, já! Mas como eu estava falando de diluir o ego, o primeiro disco é uma punheta na guitarra, sabe, egão mesmo do tipo olha como eu toco guitarra bem pra caralho, ó aprendi, sou rápido. E o segundo disco desconstrói isso, é um disco sobre canções, a guitarra é só um elemento que figura dentro do oceano auditivo do disco. E aí choca, quem espera aquela guitarra viceral.
Coolt: Você acha que esse mecado de fazer música pra filmes, ou trilha sonora, é uma mercado bom aqui no Brasil?
Dillo: Sim, porque o Brasil está crescendo pra ser um dos maiores produtores de cinema do mundo. Agora em 2009 o Brasil fez mais de 100 longas-metragem. Nunca antes tinha feito tantos filmes. O cinema tá ressucitando, tá numa ponta ascendente muito positiva, eu acredito, sou muito otimista, acredito num país melhor, acho que o Brasil é o país do futuro. Acho que o cinema tá bombando.
Coolt: Queria que você falassem um pouco do processo de composição da música pro filme. Você tem só o roteiro pra trabalhar em cima, como é?
Dillo: Varia muito. Às vezes o projeto amadurece do roteiro, o diretor vai discutindo e faz um mapeamento. Esse primeiro são os tracks temporários. Depois monta com a imagem, ouve e vai tirando. A gente sempre põe mais música do que entra na versão final. Outro processo é você já pegar o filme editado e compor em cima da cena. Varia de diretor pra diretor, tem gente que já chega cantarolando a melodia e é muito doido que às vezes você faz uma coisa que considera incrível - aconteceu comigo - a melhor trilha sonora que eu já fiz, o cara chegou e disse não é nada disso, acho que você não entendeu o que que quero. Eu fiquei embasbacado. Fiz uma outra como ele queria e eu achei horrenda...
...é aí que entra a desconstrução do ego...
Exatamente, e você tem que lidar bem com isso, o filme é do cara, você está ali como um braço. E pra mim, que vim dessa escola do ego, isso é bom, é maturidade.
Coolt: Queria que você falasse um pouquinho da onde surgiu a idéia do dvd, de lançar um dvd autobiográfico.
Dillor: O Jefferson Motta aplicou o projeto no PAC e eu nem sabia. Ele já tinha aplicado o projeto pra outros e sempre tinha sido indeferido. Eu achei que ele já era até meio pé frio (risos), dizia "Ah bicho, os projetos que tu escreve não emplaca nenhum". Daí um dia ele me ligou e falou "Ó escrevi um projeto e foi aprovado. Pra DVD." Veio aquela história de fazer um DVD do show, música por música, mas a convivência com esses diretores me permitiu detectar alguns procedimentos na composição de um filme. Aí falei: ah vou me aventurar, vou fazer um documentáio em primeira pessoa. É até prepotente né, tem gente que diz "Pô, mas você tem 34 anos e já tá fazendo DVD autobiográfico, que porra é essa? Baixa a bola, tem muito que andar" Mas eu acho que tem essa coisa da ousadia e eu me senti capacitado pra fazer isso, devido a essa experiência de 4 anos já atuando nesse segmento. Claro que fui perguntando opinião, me balizando. Fiz o material de pesquisa, fui em casa de parente, encontrei foto, fita VHS, fita K7, digitalizei todo o material, decupei tudo, escrevi o roteiro, alinhei, começei a montar, produzi música para as transições. Eu pude viajar. Eu acho que isso traria a característica do ineditismo. Porque hoje você tem muito artista. O my space no Brasil tem mais de cem mil assinaturas. Gente que nunca subiu no palco, mas está lá, ele existe. Ele está em pé de igualdade comigo que toco há 20 anos. em termos de visibilidade, de ser encontrado, de alguém investir na carreira, esse cara que nunca tocou num palco está em pé de igualdade comigo. E eu acho que valeu a pena fazer. Eu coloquei uns trechos no youtube e os comentários tem sido positivos.
Coolt: Como esse DVD vai ser comercializado?
Dillo: Nos shows, tipo idade média (risos), que o artista vai pra praça e vende. E no site, a gente entrega pelo correio.
Coolt: Você comentou e já ia ser até minha próxima pergunta. Você está com 34 anos e lançou um DVD autobiográfico. Isso quer dizer que você vai parar em breve ou não tem nada a ver?
Dillo: Ah, não sei (risos). Acho que parar, não, mas eu estou envolvido em outro projeto. Tô produzindo um espetáculo musical tambores de Okinawa do Japão e música brasileira. É uma encomenda do instituto kobayashi lá da Liberdade em São Paulo, da colônia japonesa. Estão com um projeto São Paulo/Brasília, o clube Nipo em Brasília está envolvido, e eu fui convidado pra ser o diretor musical desse espetáculo. Então pode ser que isso me provoque uma demanda que eu diminua a quantidade de shows em função desse trabalho. Mas aí também pode vir um outro filme, um disco novo, eu acho que a minha profissão é muito dinâmica. Eu tento contemplar essas oportunidades e fazer bem cada convite desse, porque o universo é música, então aonde tiver música eu vou estar e vou ser feliz, vou estar encontrado. Pra fazer uma outra coisa que não tenha nada a ver com música aí eu perco o eixo. Posso até não estar num palco, mas o meu forte é trabalhar com música, seja produzindo um espetáculo musical, trilha sonora, disco novo ou turnê. Eu não posso parar. Eu fiz isso a minha vida toda, não sei fazer outra coisa.
Coolt: Você saiu daqui em 2005, e agora em 2010 você volta, a turnê vai passar por aqui. Como é que é voltar assim pra cidade que te gerou?
Dillo: Na verdade pra mim não é muito diferente porque eu venho todo mês a Brasília, eu tenho filha aqui, minha mãe, amigos, parente minha história é aqui. Então é como se eu nunca tivesse saído daqui. Eu espero sempre que as pessoas gostem, que elas venham ver o show, gostem do show, hoje mesmo eu vou tocar muita música nova, quero ver como elas reagem...
....Mas você voltar assim bem-sucedido, de quando você se lançou no mercado dá uma sensação diferente?.. É, pra mim, ser bem-sucedido é estar encontrado com aquilo que eu faço, no meu caso viver de música. Eu vivo com dignidade, mas por outro lado é uma vida muito instável. Eu vejo os meus amigos e penso: poxa legal eu fiz alguma coisa, eu existo. Acho que hoje em dia os artistas não se dividem entre os que vão pra mídia nacional e os que não vão, se dividem entre os que existem e não existem. E eu existo, tenho alguns trabalhos. Por outro lado eu não sei se daqui a dois anos as pessoas vão me ligar pra fazer filme ou show. Eu tenho medo, minhas fraquezas, tenho medo da rejeição.
..Mas você já é bem sucedido porque Brasília respira concurso. Então nem todo mundo aqui consegue viver do que gostaria de estar vivendo. A pressão pro concurso público é grande. Isso, todo mundo aqui é moldado pra isso, com a idéia da segurança. Que é uma das coisas que eu não disponho: a segurança do ponto de vista financeiro. Mas em contra partida, muita gente que tem essa segurança se dá conta que não tem tempo suficiente de fazer aquilo que queria fazer. Eu tenho amigos muito bem empregados em órgãos públicos, com quartos cheios de guitarras e amplificadores que nunca foram tocados e eles estão amargando uma frustração muito grande.
Coolt: Você já fez tanta coisa, gravou disco, show, composição para filmes, diretor de dvd. Como artista, o que tá faltando pra te realizar?
Dillo: Uma popularização.É um gargalo que eu senti agora na minha carreira. Eu já tô preparado pra isso, se não rolar essa popularização eu me olho pra artistas que eu tenho como referência de carreira como o João Donato. João Donato nunca vendeu muitos discos, nunca fez show pra muita gente, mas ele grava há 50 anos e faz shows há 50 anos. Ele é aquele artesão da música. Se eu chegar nesse nível, já tá ok. Mas sim, eu gostaria de tocar em lugares com uma infra-estrutura melhor. Por exemplo, eu abri um show do Frejat, e quando ele subiu no palco a vatagem do som dobrou. Eu só queria estar em pé de igualdade, isso não é competição. Porque isso causa um efeito no público muito maior. Eu adoro o Frejat, acho ele um arquiteto do rock nacional. Mas, aí fica fácil ser muito melhor também, né! Não é nada contra ele, o Frejat realmente é muito bom. É o tratamento diferente com artistas locais. Porque por mais que eu transite, sempre serei um artista de Brasília.
Coolt: E o que você diz pra quem quer ser artista, ser músico?
Dillo: Tem que se jogar e estar preparado, como diz o Caetano, pra dor e a delícia de ser o que é. Que é muito bom por um lado mas machuca pelo outro, mas a arte sempre foi assim. Não dá pra ficar em cima do muro, se quiser viver de arte tem que se jogar. Não dá pra ser promotor de justiça e artista.
Em 2008 lançou “Mestiço” seu segundo CD, e se prepara agora para lançar seu filme, o documentário musical autobiográfico “Musica Roqueira Popular Brasileira” numa extensa turnê marcada para iniciar em abril de 2010, caravana esta que passará por Rio, São Paulo, Belo Horizonte, Recife e Brasilia, fechando em outubro no MIDEM em Copenhagen. Antes do Show que Dillo fez no Velvet Pub em Brasília, ele paraou um pouquinho pra falar com a gente, confira a entrevista!
Coolt: O primeiro cd - CrocodilloGang, tem uma pegada Rock’nRoll. Acho que até o fato de ser em inglês colabora para isso. Aí de repente o cd Mestiço vem transbordando brasilidade. Eu já li você comentando que está de corpo e alma nos dois trabalhos. Mas e o seu público, como ele reagiu a essa transformação?
Dillo: Na verdade, o que a gente poderia chamar de público era muita gente interessada na guitarra elétrica, muito aluno de guitarra, fãs de Rock, infanto-juvenil entre 15 e 25 anos, geralmente, amantes de guitarra, de pedais, dessa estética da guitarra elétrica. Eu acho que no primeiro momento do segundo cd, o Mestiço, foi de choque. Pelo menos eu soube, ninguém me falou diretamente, mas eu ouvi assim “Ah o Dillo tá perdendo um pouco da raiva, da fúria”; teve esse primeiro estranhamento. Num segundo momento, eu acho que, essas mesmas pessoas que tiveram esse estranhamento, ao observarem mais o disco em português, começaram a se reaproximar, eu recebo, hoje, pelo Orkut, gente que tem banda, de guitarristas, “Pô, vou lá ver teu show”, “E aquela guitarra nova”, “Que pedal você está usando”. Então, eu posso dizer que eu perdi o meu primeiro público e reconquistei a metade dele público e com o segundo álbum eu fui agregando um novo público, e hoje acho que esses dois públicos já transitam no mesmo ambiente. Eu estive agora ali embaixo (se referindo ao ambiente do Show), encontrei uma galera, já tem gente dessas duas safras...
... Mas quem te reconhece como um artista rockroll, quem conhece e gosta de rockroll meio que se prepara pra um disco não ser igual ao outro né? O seu próximo disco nunca vai ser igual ao do momento...
Exatamente, e isso me instiga muito, a coisa da possibilidade de veir uma nova paisagem, uma nova provocação, justamente pra qualificar o debate e a gente poder chegar nesse consenso de estética, de tempo, de proposição artística, eu acho.
Coolt: Te incomoda o fato de o eixo de visibilidade no Brasil hoje ser Rio/São Paulo, você ter que sair da sua cidade pra conseguir ser visto mesmo?
Dillo: Ah sim, eu gostaria de morar em Brasília Fulltime, poder pegar minha filha e levar pra escola, pra ir com a minha mãe visitar uma tia. Meu sonho! Mas se ficar só em Brasília, em 4 meses você esgota a cena, o público cansa de você e você cansa do público. Eu acho que tem circular mesmo...
... Com certeza o artista tem que circular, mas tenho a impressão de que a casa do artista nunca pode ser fora desse eixo de visibilidade...
Mas eu creio que isso vai mudar, que isso está mudando, eu sou muito otimista! Acho que Brasília é uma cidade que está ganhando uma outra proporção em termos de contingente. Por exemplo, Brasília como eu conheci quando comecei a tocar na noite era diferente, a cidade era mais vazia; então as pessoas iam pro mesmo lugar, na época o teatro garagem, a galera meio que se conhecia, a cena de rock. E hoje eu já noto que existe uma guetificação. Existe um monte de bandas, uma explosão de bandas Covers né, muita gente comprou instrumento, aprendeu a tocar, sei lá, quadriplicou o contingente populacional e eu sinto que Brasília, tá virando uma cidade de outro porte, não é mais a Brasília como eu conheci e com isso em 4 anos o artista vai poder e ter uma circulação tipo: ele toca em Brazlândia, depois toca em Sobradinho, depois na Ceilândia, Plano Piloto e assim o artista circular. Ao invés de ser como era no passado que todo mundo ia pro mesmo lugar, o artista vai pra onde as pessoas estão, porque as pessoas não transitam mais inter-bairros, por causa de congestionamento e porque a gente sabe que a cidade não é integrada também do ponto de vista de transporte público. É só achismo, mas acredito que vai poder ter essa circulação. E isso também vem agregado a um monte de outras transformações, como o impacto da era digital, porque não só a cena mudou, a cidade mudou, como mudou também os meios dentro da cadeia produtiva da música, de distribuição, de produção, muita coisa mudou, é outra dinâmica. No meu DVD eu discuto a cena, do ponto de vista do instrumentista nos anos 90, que a internet modificou, até onde ela foi nociva, como beneficiou, uma pincelada meio por alto. A música ao vivo começa a sofrer essa transformação que outras profissões da idade média sofreram, de manufatura, que foram desaparecendo pelas inovações tecnológicas. A onda da música eletrônica com os Dj`s, o desinteresse pela música orgância, a velocidade da troca de informações, a falta de fixação das manifestações artistícas. Nos anos 90 a gente comprava um disco de vinil e ficava olhando a capa durante seis meses e ouvia os dois lados do disco, eu vivi isso, de você saber as falas que tinham entre as músicas. hoje ninguém vê capa de disco. As pessoas tragam as músicas pros mp3 players, desprezam as capas e se a música está chata eles já vão pra próxima. Antigamente você tinha que abrir o toca disco, pegar a agulha com muito cuidado e levar até a próxima faixa. Era um trabalhão...
...Hoje não se vê a unidade do cd né, que é uma obra que funciona junto. Agora você escuta só um pedaço e não sabe o que o artista quer dizer com tudo..
Exatamente, dilui a idéia de álbum. Que é o que os meus 2 primeiros discos tem. Quem ouve só uma pincelada acha muito discrepante, mas se você reparar existe uma linha que permeia os dois álbuns que é a guitarra elétrica da forma como eu imprimo o som. Se a gente for analisar do ponto de vista musical, eu uso muito as escalas pentatônicas que remetem ao Blues, ao Rock. Então essa sonoridade está nos dois discos.
Coolt: Em 2005 você começou a fazer música pra cinema. Como isso afeta o seu processo de criação? Ter que fazer música para o filme.
A primeira coisa é diluir o ego né. Porque a música tem que estar a favor não é nem da cena, mas da narrativa psicológica. Pode ter uma cena linda do pôr-do-sol, mas se o protagonista está vivendo uma situação de transtorno, a música tem que incomodar. Esse é o grande diferencial: é você começar a tocar para a narrativa psicológica, e não para o que se vê ou o que se espera, isso quando é música original para o filme. Uma outra coisa é trilha sonora: pegar músicas que já existem e colocar dentro do filme como o Tarantino faz muito bem. A trilha é composta de vários artistas. A música original para o filme é chamada diegética ou seja ela não pode estar em primeiro plano. A gente nem nota que está rolando, mas se tirar, você sente falta. Às vezes fica só no som do vento e um piano com duas notas bem agudas, é outra abordagem, é muito legal. Isso abriu muito a minha cabeça até para as composições de canções da minha obra como compositor. A gente amadurece. Porque no meu primeiro disco, eu fiquei meio assim quando vocês disseram que é muito diferente, tô sempre voltando a isso ... (risos)
...Mas alguém já te disse isso antes né?
Já, já! Mas como eu estava falando de diluir o ego, o primeiro disco é uma punheta na guitarra, sabe, egão mesmo do tipo olha como eu toco guitarra bem pra caralho, ó aprendi, sou rápido. E o segundo disco desconstrói isso, é um disco sobre canções, a guitarra é só um elemento que figura dentro do oceano auditivo do disco. E aí choca, quem espera aquela guitarra viceral.
Coolt: Você acha que esse mecado de fazer música pra filmes, ou trilha sonora, é uma mercado bom aqui no Brasil?
Dillo: Sim, porque o Brasil está crescendo pra ser um dos maiores produtores de cinema do mundo. Agora em 2009 o Brasil fez mais de 100 longas-metragem. Nunca antes tinha feito tantos filmes. O cinema tá ressucitando, tá numa ponta ascendente muito positiva, eu acredito, sou muito otimista, acredito num país melhor, acho que o Brasil é o país do futuro. Acho que o cinema tá bombando.
Coolt: Queria que você falassem um pouco do processo de composição da música pro filme. Você tem só o roteiro pra trabalhar em cima, como é?
Dillo: Varia muito. Às vezes o projeto amadurece do roteiro, o diretor vai discutindo e faz um mapeamento. Esse primeiro são os tracks temporários. Depois monta com a imagem, ouve e vai tirando. A gente sempre põe mais música do que entra na versão final. Outro processo é você já pegar o filme editado e compor em cima da cena. Varia de diretor pra diretor, tem gente que já chega cantarolando a melodia e é muito doido que às vezes você faz uma coisa que considera incrível - aconteceu comigo - a melhor trilha sonora que eu já fiz, o cara chegou e disse não é nada disso, acho que você não entendeu o que que quero. Eu fiquei embasbacado. Fiz uma outra como ele queria e eu achei horrenda...
...é aí que entra a desconstrução do ego...
Exatamente, e você tem que lidar bem com isso, o filme é do cara, você está ali como um braço. E pra mim, que vim dessa escola do ego, isso é bom, é maturidade.
Coolt: Queria que você falasse um pouquinho da onde surgiu a idéia do dvd, de lançar um dvd autobiográfico.
Dillor: O Jefferson Motta aplicou o projeto no PAC e eu nem sabia. Ele já tinha aplicado o projeto pra outros e sempre tinha sido indeferido. Eu achei que ele já era até meio pé frio (risos), dizia "Ah bicho, os projetos que tu escreve não emplaca nenhum". Daí um dia ele me ligou e falou "Ó escrevi um projeto e foi aprovado. Pra DVD." Veio aquela história de fazer um DVD do show, música por música, mas a convivência com esses diretores me permitiu detectar alguns procedimentos na composição de um filme. Aí falei: ah vou me aventurar, vou fazer um documentáio em primeira pessoa. É até prepotente né, tem gente que diz "Pô, mas você tem 34 anos e já tá fazendo DVD autobiográfico, que porra é essa? Baixa a bola, tem muito que andar" Mas eu acho que tem essa coisa da ousadia e eu me senti capacitado pra fazer isso, devido a essa experiência de 4 anos já atuando nesse segmento. Claro que fui perguntando opinião, me balizando. Fiz o material de pesquisa, fui em casa de parente, encontrei foto, fita VHS, fita K7, digitalizei todo o material, decupei tudo, escrevi o roteiro, alinhei, começei a montar, produzi música para as transições. Eu pude viajar. Eu acho que isso traria a característica do ineditismo. Porque hoje você tem muito artista. O my space no Brasil tem mais de cem mil assinaturas. Gente que nunca subiu no palco, mas está lá, ele existe. Ele está em pé de igualdade comigo que toco há 20 anos. em termos de visibilidade, de ser encontrado, de alguém investir na carreira, esse cara que nunca tocou num palco está em pé de igualdade comigo. E eu acho que valeu a pena fazer. Eu coloquei uns trechos no youtube e os comentários tem sido positivos.
Coolt: Como esse DVD vai ser comercializado?
Dillo: Nos shows, tipo idade média (risos), que o artista vai pra praça e vende. E no site, a gente entrega pelo correio.
Coolt: Você comentou e já ia ser até minha próxima pergunta. Você está com 34 anos e lançou um DVD autobiográfico. Isso quer dizer que você vai parar em breve ou não tem nada a ver?
Dillo: Ah, não sei (risos). Acho que parar, não, mas eu estou envolvido em outro projeto. Tô produzindo um espetáculo musical tambores de Okinawa do Japão e música brasileira. É uma encomenda do instituto kobayashi lá da Liberdade em São Paulo, da colônia japonesa. Estão com um projeto São Paulo/Brasília, o clube Nipo em Brasília está envolvido, e eu fui convidado pra ser o diretor musical desse espetáculo. Então pode ser que isso me provoque uma demanda que eu diminua a quantidade de shows em função desse trabalho. Mas aí também pode vir um outro filme, um disco novo, eu acho que a minha profissão é muito dinâmica. Eu tento contemplar essas oportunidades e fazer bem cada convite desse, porque o universo é música, então aonde tiver música eu vou estar e vou ser feliz, vou estar encontrado. Pra fazer uma outra coisa que não tenha nada a ver com música aí eu perco o eixo. Posso até não estar num palco, mas o meu forte é trabalhar com música, seja produzindo um espetáculo musical, trilha sonora, disco novo ou turnê. Eu não posso parar. Eu fiz isso a minha vida toda, não sei fazer outra coisa.
Coolt: Você saiu daqui em 2005, e agora em 2010 você volta, a turnê vai passar por aqui. Como é que é voltar assim pra cidade que te gerou?
Dillo: Na verdade pra mim não é muito diferente porque eu venho todo mês a Brasília, eu tenho filha aqui, minha mãe, amigos, parente minha história é aqui. Então é como se eu nunca tivesse saído daqui. Eu espero sempre que as pessoas gostem, que elas venham ver o show, gostem do show, hoje mesmo eu vou tocar muita música nova, quero ver como elas reagem...
....Mas você voltar assim bem-sucedido, de quando você se lançou no mercado dá uma sensação diferente?.. É, pra mim, ser bem-sucedido é estar encontrado com aquilo que eu faço, no meu caso viver de música. Eu vivo com dignidade, mas por outro lado é uma vida muito instável. Eu vejo os meus amigos e penso: poxa legal eu fiz alguma coisa, eu existo. Acho que hoje em dia os artistas não se dividem entre os que vão pra mídia nacional e os que não vão, se dividem entre os que existem e não existem. E eu existo, tenho alguns trabalhos. Por outro lado eu não sei se daqui a dois anos as pessoas vão me ligar pra fazer filme ou show. Eu tenho medo, minhas fraquezas, tenho medo da rejeição.
..Mas você já é bem sucedido porque Brasília respira concurso. Então nem todo mundo aqui consegue viver do que gostaria de estar vivendo. A pressão pro concurso público é grande. Isso, todo mundo aqui é moldado pra isso, com a idéia da segurança. Que é uma das coisas que eu não disponho: a segurança do ponto de vista financeiro. Mas em contra partida, muita gente que tem essa segurança se dá conta que não tem tempo suficiente de fazer aquilo que queria fazer. Eu tenho amigos muito bem empregados em órgãos públicos, com quartos cheios de guitarras e amplificadores que nunca foram tocados e eles estão amargando uma frustração muito grande.
Coolt: Você já fez tanta coisa, gravou disco, show, composição para filmes, diretor de dvd. Como artista, o que tá faltando pra te realizar?
Dillo: Uma popularização.É um gargalo que eu senti agora na minha carreira. Eu já tô preparado pra isso, se não rolar essa popularização eu me olho pra artistas que eu tenho como referência de carreira como o João Donato. João Donato nunca vendeu muitos discos, nunca fez show pra muita gente, mas ele grava há 50 anos e faz shows há 50 anos. Ele é aquele artesão da música. Se eu chegar nesse nível, já tá ok. Mas sim, eu gostaria de tocar em lugares com uma infra-estrutura melhor. Por exemplo, eu abri um show do Frejat, e quando ele subiu no palco a vatagem do som dobrou. Eu só queria estar em pé de igualdade, isso não é competição. Porque isso causa um efeito no público muito maior. Eu adoro o Frejat, acho ele um arquiteto do rock nacional. Mas, aí fica fácil ser muito melhor também, né! Não é nada contra ele, o Frejat realmente é muito bom. É o tratamento diferente com artistas locais. Porque por mais que eu transite, sempre serei um artista de Brasília.
Coolt: E o que você diz pra quem quer ser artista, ser músico?
Dillo: Tem que se jogar e estar preparado, como diz o Caetano, pra dor e a delícia de ser o que é. Que é muito bom por um lado mas machuca pelo outro, mas a arte sempre foi assim. Não dá pra ficar em cima do muro, se quiser viver de arte tem que se jogar. Não dá pra ser promotor de justiça e artista.
0 Response to "Entrevista da Semana: Dillo Daraujo"